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A Balada do Rohirrim - Cap 2 - A filha do Cavaleiro

  • Cléo Lourenço
  • 8 de set. de 2017
  • 6 min de leitura

Atualizado: 19 de set. de 2021

Capítulo 2: A filha do Cavaleiro

Image by Rederst


Image by Rederst

Findaram-se as festividades primaveris. Logo, os deleites dos banquetes e toda a animação das danças e das incansáveis rodas de conversas onde os cavaleiros contavam cada detalhe de suas aventuras, não passavam de doces lembranças de um passado recente. Logo, a corte galante dos rapazes à procura de jovens esposas e as animadas conversas e elogios não passavam apenas de doces divagações entre os bordados e as noites se tornavam ainda mais tediosas, apesar de Elanor contar sempre com a companhia leal e gentil de suas irmãs.


Depois de tantos dias experimentando conversas e convivendo com os mais variados pretendentes, entre os mais valorosos cavaleiros de Rohan, o bordado e os enfeites de flores eram ainda mais aborrecidos do que antes para a inquieta jovem. Mais do que os flertes, a menina ansiava pelas sensações que as aventuras vividas pelos valorosos eorlingas despertavam dentro de si. Logo, trocou de vez as rendas pela companhia constante do pai e do irmão, chegando a persegui-los quando estavam em casa, na tentativa de acompanhá-los em suas tarefas diárias. Desta forma, conseguia, de vez em quando, companhia e permissão para sair em breve cavalgada, sempre acompanhada por um dos dois. Momentos escassos, mas em que se sentia mais viva.


Não que a jovem tivesse aversão aos afazeres domésticos. Na verdade, ela apreciava um bom bordado e adorava enormemente se enfeitar com as rendas que ela e as irmãs teciam em casa. No entanto, apreciava a montaria como se sua alma dependesse daquilo para respirar. Era pois, o momento em que mais se sentia livres, pois, aos poucos, ia entendendo que de nada adiantava ter um gênio forte. Sua condição feminina era, muitas vezes, como um cabresto a forçando a uma submissão a qual ela odiava e não aceitava com a docilidade que os cavalos demonstrava a seus cavaleiros. Ela era indomável e não podia se calar diante dos desmandos que lhe eram impostos. Ainda mais quando, certo dia, algum tempo depois do festival, seu pai anunciou que Anne se casaria com um cavaleiro que ele mesmo escolhera.


Aquela deveria ser uma noite agradável. Sor Grant havia convidado para o jantar o capitão Alec e sor Wulfric, outro capitão dos eorlingas e toda a conversa da noite havia sido sobre os assuntos que Elanor mais gostava: a cavalaria e os feitos heróicos dos cavaleiros. Foi então que, em um determinado momento do jantar, sor Grant se pronunciou, anunciando que sor Wulfric havia pedido a corte à mais velha de suas filhas. Então, o que deveria ser uma ótima notícia, para a maioria das famílias, transformou-se em uma enorme contenda, quando Elanor se pronunciou contrária à decisão de seu pai.


Apesar de não gostar nem um pouco de Armitage, Elanor sabia bem que sua irmã nutria sentimentos pelo rapaz e a proposta de um casamento arranjado colocava um fim a todos os sonhos de Anne que era dócil demais para se pronunciar contra a decisão do pai. Mas Elanor, não. Ela sabia como aquilo magoava a irmã e, por amá-la acima de qualquer coisa, levantou-se e bradou em alto e bom tom:


- Mas que anúncio sem propósito! Acaso perguntaram a Anne o que diabos ela mesma quer? Estão aí planejando a vida dela sem nem ao menos saber o que minha irmã acha disso!


Obviamente, aquilo pegou a todos de surpresa. Anne ficou lívida e pálida como a toalha que cobria a mesa do jantar, enquanto Hella levou as mãos aos lábios cobrindo-os e abafando um gritinho. Do outro lado da mesa, sor Grant engasgou-se com o vinho que bebia e Alec a mirou divertidamente espantado. Sentado ao lado de Alec, sor Wulfric a olhava de Elanor para seu pai sem parecer entender muito bem o que se passava. Foi então que Halled, primogênito de sor grant e, portanto, o irmão mais mais velho de Elanor, se pronunciou tentando amenizar a situação.


- Oras, eis que este é um assunto pertinente apenas a papai e sor Wulfric, querida Elanor, portanto, deixe-os tratar disso como devem.


- Isso é que não! - Elanor continuou sem se preocupar com o olhar de reprovação de seu irmão - Se trata do futuro de Anne e ela tem que estar de acordo, não é mesmo?


Alec disfarçou uma risada colocando mais um pedaço de pão na boca, mas continuou a olhar divertido a maneira como a jovem Elanor tentava impor seus pensamentos. Dificilmente garotas como ela se imporiam a uma decisão familiar, mas a impetuosa filha de sor Grant não só se mostrava contrária a seu pai, como estava resolvida a defender a irmã naquela questão.


- Já chega! - o velho cavaleiro retomou a atenção de todos - Estes são assuntos que não lhe dizem respeito, minha filha, portanto, não se preocupe com eles.


- É verdade! - Wulfric riu parecendo um pouco mais seguro diante da palavra de Sor grant - Devia se preocupar com as rendas que vai fiar e com os vestidos a usar em nosso casamento, senhorita, pois esses arranjos matrimoniais são muito complicados. Deixe-os para nós que já lidamos com coisas tão cansativas. São assuntos da alçada de homens e não de jovens tão tenras.


Então a jovem se fez rubra. Sua respiração um pouco mais pesada fazia com que suas narinas se dilatassem um pouco mais, quase que imperceptivelmente, indicando uma respiração pesada e tensa. Por um instante, pareceu mesmo que ela iria se calar. Mas Alec percebeu que aquilo era apenas um respirar antes de uma grande explosão. Ela não desistiria ali, agora que fora tão afrontada.


- Por isso insisto que Anne diga o que pensa. Este senhor que se apresenta como futuro noivo de minha irmã nada entende de mulheres, papai. Deviam casá-lo com um dos mearas, pois ele próprio é tão torpe quanto uma cavalgadura.


É claro que não houve mais jantar após aquilo. Pelo menos para Elanor que de brinde ganhou mais um castigo: estava proibida de sair de casa e não deveria mais cavalgar. Segundo seu pai, já estava passando da hora dela agir como uma mulher, pois não era mais uma criança. Devia entender seus deveres de mulher e calar-se diante de conversas que não lhe diziam respeito. Anne também se retirara do jantar, seguida de Hella. Ao que parecia, seu pai havia decidido que nenhuma delas era necessária na mesa, depois que a do meio se rebelou.


No quarto que dividia com as irmãs, Elanor ainda andava furiosa de um lado para o outro, enquanto Anne se desmanchava em lágrimas. Era óbvio que ela não queria se casar, mas sua submissão era tamanha nem sequer se pronunciou sobre tudo aquilo.


-O que você queria? Não foi nem capaz de se defender! De lutar pelo que você quer! - Elanor ralhou com a mais velha, pois estava visivelmente decepcionada. - Se deixar, eles farão de ti o que bem entenderem!


-Acalme-se Elanor! - pediu Hella assustada e sentida com a maneira que a outra tratava Anne - Ela não tem culpa! Lembre-se de que é ela quem vai ter que se casar.


-Se continuar apenas chorando e de boca fechada, vão fazer pior ainda com ela! - furiosa, Elanor virou-se para a caçula - E contigo também, se agir como uma paspalha!


Então, sentiu as mãos de Anne tocarem sua saia e a puxando para um abraço:

-Perdoe-me! - a mais velha das irmãs soluçava em desespero - Não sou tão forte nem impetuosa como você, Elanor! Me ajude! Amo Armitage! Não deixe que papai me case com sor Wulfric!


Elanor suspirou diante de tão sentido e deprimente pedido, mas apenas deixou seus dedos se deslizarem sobre a cabeça da mais velha e sentiu-se afagar os cabelos de Anne num carinho um pouco trêmulo e ressentido.


-Deixe de besteiras. Não vão te casar com ninguém sem a sua vontade.- tentou apaziguar a si e às irmãs - Nenhuma de nós vai. Eu não vou deixar acontecer.


Depois, quando as luzes se apagaram e a casa toda adormeceu, Elanor podia ouvir o ressonar da respiração das irmãs que dormiam calmamente em camas próximas a si, tão vulneráveis e indefesas. Em sua vigília, porém, a jovem só conseguia pensar em quão fugaz fora a alegria dos dias do festival de primavera. Tanto para ela quanto para sua irmã Anne, todas aquelas lembranças agora pareciam tão distantes. As cores intensas e os cantos alegres haviam se desfeito e os tons pastéis dominavam tanto a paisagem quanto a alma da jovem Elanor. Pela primeira vez sentia o peso de sua condição a esmagando sem que ela pudesse fazer nada. A submissão de Anne diante de um futuro indesejado e a imposição injusta feita pelo pai aprisionavam-lhe a alma de maneira sufocante. Ao que parecia, toda a liberdade que experimentara até aquele momento era algo dado apenas a uma criança graciosa e aos homens, pois esses sim eram os verdadeiros senhores de tudo. Ela deveria calar-se e submeter-se. Curvar-se e apenas aceitar.


Então ela se lembrou de um sorriso no meio do caos. Único no meio de toda a balbúrdia que provocara no salão de jantar. Mas não era um sorriso jocoso ou um de desdém. Era um sorriso surpreso, quase de aprovação. Poderia estar bem enganada, mas podia jurar que vira Alec sorrindo quando ela se levantou quanto a decisão daquele embuste de casamento arranjado.

Elanor remexeu-se na cama suspirando. Devia ser um engano, provavelmente o capitão estava era rindo dela e de seu fracasso. Mas ela não daria esse gostinho a eles. Não estava vencida. Anne não se casaria a não ser por vontade própria e ela mesma não deixaria que lhe colocassem cabrestos. Estava para nascer quem lhe impedisse de ser o que ela quisesse ser e sua liberdade nunca seria entregue tão facilmente.




 
 
 

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